Queen faz show tributo a si mesmo em SPMarco Tomazzoni
No primeiro de seus dois shows em São Paulo, o Queen tocou por 2h30. A julgar pela reação da plateia, o vocalista Paul Rodgers foi aprovado no lugar de Freddie Mercury
Há pouco mais de duas décadas, o Queen fez shows antológicos no Brasil que lotaram estádios e reuniram famílias inteiras. Ontem à noite, em São Paulo, levou apenas fãs fiéis e ardorosos a um Via Funchal cheio (mas não lotado), na primeira de duas apresentações caríssimas na cidade, cujo ingresso mais barato custava R$ 270. Devoto, o público vibrou por 2h30 com os hinos da banda, que, na ausência de seu astro maior, fez um tributo a si mesma.
Coube a Paul Rodgers, vocalista do Free e Bad Company, a tarefa de segurar o microfone no lugar de Freddie Mercury e, a julgar pela reação da plateia, cumpriu bem a tarefa. Os holofotes, no entanto, estavam voltados para os dois remanescentes do Queen – o guitarrista Brian May e o baterista Roger Taylor – e foram eles que assumiram o posto que um dia foi de Mercury.
Desde o início se percebia que o show seria da dupla. Já em “Hammer to Fall” May foi para a rampa que saía do palco e adentrava a pista vip posar para fotos solando, e foi por ali que se manteve boa parte do tempo, ao alcance das mãos e do calor do público. Radiante, o guitarrista trazia no rosto a felicidade de voltar ao showbiz, atitude corajosa se levarmos em conta a gigantesca lacuna deixada por Mercury.
E foi justamente a referência ao cantor que rendeu o primeiro belo momento da noite. Sentado na rampa com um violão nas mãos, May perguntou, em português mesmo: “Vocês gostam de cantar? Querem cantar para Freddie?”. Na sequência, defendeu sozinho “Love of My Life”, mas por pouco tempo, já que a plateia cantou a música inteira, verso por verso, para depois gritar em coro o nome do guitarrista. Emocionado, ele engoliu em seco, chorou e disse: “Essa é sua música, Brasil”. A ovação continuaria ao longo da noite, sempre que May tocasse seus solos, com espaço garantido em todas as canções.
Roger Taylor também teve seus minutos em evidência, nunca, no entanto, com a mesma intensidade de May. Instalado na rampa, brincou de batucar nas cordas de um baixo, nos pratos e depois na bateria completa, em uma improvisação longa e arrastada, inserida estrategicamente para angariar aplausos também ao baterista.
O mesmo expediente foi aplicado a Rodgers. O terceiro e último integrante do Queen + Paul Rodgers teve seus momentos sozinho no palco, quando defendeu “Seagull” e “Bad Company”, de seu trabalho pregresso, e que renderam palmas discretas. Correto, sem chamar a atenção nem exagerar na potência de sua voz, Rodgers ficava longos intervalos nos bastidores enquanto Taylor e May colhiam os louros, evitando assim as temíveis comparações com Freddie.
E não há o que comparar. O fantasma de Freddie Mercury acompanhou todo o show e, inclusive, cantou duas músicas na tela de alta definição: “Bijou” e “Bohemian Rapsody”, esta em dueto com Rodgers. Sempre que aparecia no vídeo, Freddie arrancava olhares embasbacados do público, emocionado por rever seu ídolo fazendo praticamente uma apresentação ao vivo.
Por isso o show parece mais uma homenagem a Mercury do que a turnê de uma banda que acaba de lançar um disco de inéditas, o fraco The Cosmos Rocks. Por mais bem-intencionadas que sejam, as versões atuais dos hits não deixam de ser covers de luxo, inferiores às originais. “I Want to Break Free” é um exemplo conclusivo – o drama e a ambiguidade que são marcas registradas do Queen deram lugar à postura plana e viril de Rodgers. A personalidade evaporou e ficou só o hard rock sem maior apelo.
Mesmo assim, o repertório ímpar do grupo, repleto de pérolas pop, arrancou reações catárticas da plateia, interessada apenas em escutar suas músicas favoritas. “Another One Bites the Dust”, “A Kind of Magic”, “Radio Ga Ga” e “Crazy Little Thing Called Love”, só para citar algumas, estimularam um espetáculo de palmas, mãos para o alto e gritos difícil de encontrar, tanto que o grupo não parava de agradecer a recepção.
E é para esses fãs incondicionais que o Queen + Paul Rodgers tem sua razão de existir. Para os outros, soa apenas como um tributo ao que a banda já foi um dia, uma homenagem cujo clichê de encerrar a noite com “We Are the Champions” não surpreende. O grupo sobe novamente ao palco do Via Funchal nesta quinta-feira e encerra a turnê mundial sábado, no Rio de Janeiro. Recomendável apenas para os mais radicais.
Confira abaixo o setlist do primeiro show em São Paulo:
“Hammer to Fall”
“Tie Your Mother Down”
“Fat Bottomed Girls”
“Another One Bites the Dust”
“I Want It All”
“I Want to Break Free”
“C-Lebrity”
“Surf’s Up… School’s Out”
“Seagull”
“Love of My Life”
“I’m In Love With My Car”
“A Kind of Magic”
“Say It’s Not True”
“Bad Company”
“We Believe”
“Bijou”
“Under Pressure”
“Radio Ga Ga”
“Crazy Little Thing Called Love”
“The Show Must Go On”
“Bohemian Rhapsody”
Bis
“Cosmos Rockin”
“All Right Now”
“We Will Rock You”
“We Are the Champions”